Com a cabeça fria, passada a espuma dos acontecimentos e com o distanciamento que uma semana e meia permite, um olhar em 12 itens sobre o Congresso do PSD que decorreu em Torres Vedras, de 12 a 14 deste mês.
1. O sal e a pimenta que temperavam os Congressos do PSD, que empolgavam os militantes e, através dos directos da comunicação social, monopolizavam as conversas dos portugueses, perderam-se completamente a partir do momento em que o principal motivo de interesse já estava resolvido 2 semanas antes - a eleição do líder em directas.
O Congresso arrastou-se, assim, com intervenções, na sua generalidade, irrelevantes .
Daí toda a gente considerar o Congresso como morno - na realidade foi incolor, inodoro, e insípido .
Sou, no entanto, favorável às directas pois, como se viu, permite um inegável aumento da participação dos militantes nas decisões mais importantes da vida do partido e, portanto, produz um acréscimo de democraticidade interna.
É, também, o maior obstáculo ao fabrico prévio de líderes por parte da aristocracia que ainda domina o aparelho partidário.
2. Expurgado dos debates das candidaturas a líder e respectivas moções de estratégia, é um disparate (e uma perda de tempo) um Congresso com uma duração de 3 dias.
O sábado chegava perfeitamente e permitia significativas economias ao partido e aos participantes.
3. As moções, por serem inúmeras e, geralmente, marcadamente sectoriais, são apresentadas de afogadilho e em ambiente não propicio a uma discussão profícua.
Na realidade, a moção importante - a de estratégia global do líder, já está prévia e tacitamente aprovada.
Aliás, dá a impressão que uma boa parte das moções se destinam, apenas, a marcar terreno nas concelhias e distritais.
4. Foi penoso ver (e ouvir) a sucessão de gente que subiu ao palco apenas para lembrar a Luís Filipe Menezes que o apoiaram durante a campanha para as directas.
O que, em politiquês , significa: "não te esqueças de mim quando houver distribuição de lugares"...!
5. Ainda mais penoso foi ver (e ouvir) a fila de apoiantes de Luís Marques Mendes, declarar esse facto (o que era do conhecimento público ) mas acrescentar que estavam ali para apoiar a unidade do partido e colaborar lealmente com o novo líder.
O que, em politiquês , significa : "não te esqueças de mim na próxima distribuição de lugares porque sou indispensável para a unidade do partido"...!
E de lealdades, em politica, estamos conversados...
6. Este foi um Congresso essencialmente "popular".
Com a quase completa ausência de barões e outros fidalgos (hão-de reaparecer quando Luís Filipe Menezes ganhar as próximas legislativas), o parque automóvel sofreu uma visível e muito notada alteração: as fogosas máquinas de topo de gama que atafulhavam , antigamente, as imediações dos congressos, deram lugar a carros normais, de gente normal.
7. Teve imensa piada ver os poucos barões presentes circularem sozinhos sem as numerosas comitivas de atentos, veneradores e obrigados seguidores de outrora.
Neste Congresso, além de deambularem sozinhos tentavam (oh! milagre dos céus!) cumprimentar, pessoalmente, todas as pessoas com quem se cruzavam (onde a pose superior e o cumprimento fugaz e sobranceiro de outros tempos?).
8. Foi penoso ver e ouvir uma das referências do partido actuar, uma vez mais, à António Vitorino, desaparecendo sempre que algum desafio partidário exige a sua candidatura.
Com efeito, Manuela Ferreira Leite saiu diminuída deste Congresso: além de se furtar ao desafio que lhe foi proposto, enredou-se num discurso que, apesar de doutoral, não passou de um punhado de considerações do mais tacanho e mesquinho tacticismo .
Regionalização: não falar, porque é fracturante e quem tem compromissos com o eleitorado é o PS. Então Luís Filipe Menezes, na sua moção , não se tinha mostrado, moderaamente , favorável? E sobre os assuntos sobre os quais o PS tem compromissos o PSD não deve tomar posição? Era o que mais faltava!
Referendo do tratado europeu: não falar porque senão arriscamo-nos a ter a mesma posição que o PS! Portanto, se o PS cantar o hino nacional, o PSD deve cantar a "Joana come a papa"!, para se diferenciar!
Descida dos impostos: nem pensar, senão estamos a dizer ao eleitorado que o governo do PS governou tão bem que é possível diminuir a carga fiscal! Mas percebi bem? ou a senhora ensandeceu?
9. Aguiar Branco foi marcar terreno para uma próxima disputa para líder.
Parece que teria sido um excelente Ministro da Justiça se tivesse tido tempo para isso.
Como putativo líder, enredou-se num fastidioso e interminável discurso sobre elites e militantes a que ninguém, saudavelmente, ligou importância.
10. Deste Congresso, sem dúvida , os únicos salvados que vão ficar para o futuro são os dois excelentes discursos de Luís Filipe Menezes: o de abertura e o de encerramento (especialmente este, apesar de um pouco longo).
Marcou a agenda dos próximos tempos e lançou um repto que vai alimentar muitas e boas discussões nos próximos anos: a necessidade de uma nova Constituição expurgada dos pressupostos ideológicos marxistas que marcam a Constituição vigente .
Voltaremos com mais vagar e detalhe a estes discursos.
11. A grande debilidade do Congresso: as listas, especialmente a mais importante - a da Comissão Politica Nacional.
Para quem ganhou em eleições directas e com tal expressividade, que sentido faz apresentar listas com tantas irrelevâncias politicas, alguns fantasmas esquecidos do passado, sem renovação , sem aparente capacidade mobilizadora de militantes e, mais importante, dos eleitores?
A ver vamos se traduzem uma opção pessoal ou cedência a pressões de alguém.
Isto é: se vão servir para alguma coisa ou, se pelo contrário, Luís Filipe Menezes vai actuar e decidir apenas com base na sua visão pessoal embora assessorada pela sua entourage inicial (que, aparentemente, parece estar pouco representada as listas).
Voltaremos, também, a este assunto.
12. Finalmente, duas questões centrais para os próximos actos eleitorais: juventude e mulheres.
A juventude, em geral, e a JSD, em particular, ficaram célebres em campanhas eleitorais de antanho: quem se esqueceu do papel e da importância da juventude nas vitórias de Aníbal Cavaco Silva?
Neste Congresso, no seguimento dos imediatamente anteriores, quase não se viram (nem se ouviram) jovens; o alheamento da juventude está a tomar proporções inquietantes.
A paupérrima representação das mulheres (havia delegadas? - não se notou!) e os rarísimos e subalternos lugares a elas reservados nas listas, foram chocantes.
O período áureo de Cavaco Silva marcou uma progressiva subida das mulheres aos cargos de responsabilidade partidária e governamental.
Desde Durão Barroso que as mulheres parecem só servir, no PSD, para enfeitar jantares de apoio a homens.
Todavia são já, hoje, a maioria dos técnicos superiores em qualquer ramo das actividades profissionais, mesmo das, outrora, mais tradicionalmente masculinas.
Em que órgãos do partido está traduzida esta realidade?
Constituem mais de 54% do eleitorado em geral.
Em que órgãos do partido está traduzida esta realidade?
Voltaremos, sem dúvida, a esta questão