Em gestão corrente ...como o País...

Outubro 22 2007

    

   A respeito do Vento circulam rumores , murmuram-se suspeitas, dizem-no velhaco e atrevido, capadócio a quem é perigoso dar ousadia.

  Citam-se as brincadeiras habituais do irresponsável: apagar lanternas, lamparinas, candeeiros, fifós para assombrar a Noite; despir as árvores dos belos vestidos de folhagens, deixando-as nuinhas.

   Pilhérias de evidente mau gosto; no entanto, por incrível que pareça, a Noite suspira ao vê-lo e as árvores do bosque rebolam-se contentes à sua passagem, umas desavergonhadas.

   A caçoada predilecta do Vento é meter-se por baixo da saia das mulheres, suspendendo-as com malévola intenção exibicionista.

   Truque de seguríssimo efeito nos tempos de antanho, traduzindo-se em risos, olhares oblíquos e cobiçosos, contidas exclamações de gula, ahs! e ohs! entusiásticos.

   Antigamente, porque hoje o Vento não obtém o menor sucesso com tão gasta demonstração: exibir o quê, se tudo anda à mostra e quanto mais se mostra menos se quer ver?

   Quem sabe,  as gerações futuras lutarão contra o visível e o fácil, exigindo, em passeatas e comicios, o escondido e o dificil.

    

Jorge Amado,

in "O Gato Malhado E A Andorinha Sinhá - Uma História De Amor", Publicações Dom Quixote,

Lisboa, 2004, 9ª ed.

(escrito em1948, para o filho João Jorge, no seu 1º aniversário)

  

 


emgestaocorrente às 18:30

Outubro 20 2007

   

   Manhã vem chegando devagar, sonolenta; três quartos de hora de atraso, funcionária relapsa.

   Demora-se entre as nuvens, preguiçosa, abre a custo os olhos sobre o campo, ai que vontade de dormir sem despertador, dormir até não ter mais sono!

   Se lhe acontecer arranjar marido rico, a Manhã não mais acordará antes das onze e olhe lá.   

   Cortinas nas janelas para evitar a luz violenta, café servido na cama.

   Sonhos de donzela casadoira, outra a realidade da vida, de uma funcionária subalterna, de rígidos horários.

   Obrigada a acordar cedíssimo para apagar as estrela que a Noite acende com medo do escuro.

   A Noite é uma apavorada, tem horror às trevas.

   Com um beijo, a Manhã apaga cada estrela enquanto prossegue a caminhada em direcção ao horizonte.

   Semi-adormecida, bocejando, acontece-lhe esquecer algumas sem apagar.

   Ficam as pobres acesas na claridade, tentando inútilmente brilhar durante o dia, uma tristeza.

...

   

Jorge Amado, abertura do livro "O Gato Malhado E A Andorinha Sinhá - uma história de amor", D. Quixote, 9ª edição, 1999.

(escrito em 1948 para o filho João Jorge, no seu 1º aniversário)

  


emgestaocorrente às 11:56

Outubro 11 2007

   

   Era uma vez antigamente, mas muito antigamente, nas profundas do passado, quando os bichos falavam, os cachorros eram amarrados com linguiça, alfaiates casavam com princesas e as crianças chegavam no bico das cegonhas.

   Hoje meninos e meninas já nascem sabendo tudo, aprendem no ventre materno, onde se fazem psicanalizar para escolher cada qual seu complexo preferido, a angústia a solidão, a violência.

   Aconteceu naqele então uma história de amor.

   

(Prólogo do livro "O Gato Malhado e a Andorinha Sinhá",de Jorge Amado, dedicado a seu filho João Jorge, no seu 1º aniversário - 1948)

emgestaocorrente às 22:06

Outubro 11 2007

     

O mundo só vai prestar

Para nele se viver

No dia em que a gente ver

Um gato maltês casar

Com uma alegre andorinha

Saindo os dois a voar

O noivo e sua noivinha

Dom Gatão e dona Andorinha.

    

(Trova e filosofia de Estevão da Escuna, poeta popular estabelecido no Mercado das Sete Portas, na Bahia.)

  

Citado na abertura de " O Gato Malhado e a Andorinha Sinhá", de Jorge Amado, Publicações D. Quixote, 2004.

   

 


 

emgestaocorrente às 21:56

mais sobre mim
Fevereiro 2013
Dom
Seg
Ter
Qua
Qui
Sex
Sab

1
2

3
4
5
6
7
8
9

10
11
12
13
14
15
16

17
18
19
20
21
22
23

24
25
26
27
28


links
pesquisar
 
blogs SAPO